RIO DO ENGENHO, DE ILHÉUS PARA O MUNDO

 

Exposição da cachaças no alambique do Rio do Engenho

Por Walmir Rosário*

Ilhéus, que já foi chamada de Princesinha do Sul no auge da chamada civilização do cacau, desponta, agora, como produtora de cachaça. É a Cachaça (com C maiúsculo, sim) Rio do Engenho, produzida no distrito do Japu e apreciada pelos mais finos paladares de todo o mundo. E a cachaça é um dos produtos brasileiros em ascensão nos mercados nacional e internacional, a cada dia mais presente nas mesas mais bem-postas e requintadas.

Diferenciada da chamada pinga, conhecida por geralmente ser consumida pelas pessoas de baixo poder aquisitivo, a cachaça ganhou status e algumas marcas são disputadíssimas no mercado, a depender da data da safra e do controle da produção. Sem querer bancar o empedernido nacionalista, as marcas de whisky que se cuidem, pois a cachaça a cada dia está mais presente nas lojas especializadas na distribuição de bebidas finas, com preços para todos os bolsos.

E a Cachaça Rio do Engenho surgiu justamente na evolução desse mercado, se distinguindo e até se sobressaindo frente as marcas famosas produzidas em regiões como Salinas, Minas Gerais, tida e havida como berço da cachaça no Brasil. Se as cachaças de Salinas se impõem pela tradição, a Rio do Engenho se consolidou pelo seu DNA: cada um dos tipos de cachaça obedece, rigorosamente, um processo de produção, descanso e envelhecimento.

DNA, sim, esse é o nome mais apropriado para apresentar os tipos de cachaça que passam pela linha de produção da Fazenda Chapada dos Boiadeiros, por Luiz Fernando Galletti, paulista radicado em Ilhéus e que produz as cachaças Acqua Benta e Rio do Engenho, de forma artesanal. Para oferecer ao mercado cachaça de qualidade, todo o processo é feito obedecendo a um controle rigoroso de qualidade.

Cachaças para os mais diversos paladares
Cada um dos tipos de cachaça obedece um processo especial, finalizando com o envelhecimento nos tonéis de madeira. Os tonéis são fabricados a partir das madeiras umburana (cerejeira) e itiúba; castanheira e louro canela; bálsamo e louro canela, com percentuais diferenciados. Já a cachaça do tipo reserva especial passa por dois tipos de combinação de tonéis de madeira, o que lhe confere um buquê diferenciado.

E uma das preocupações de Luiz Fernando é agradar ao paladar de brasileiros e estrangeiros, daí esse envelhecimento em tonéis de madeira diferentes, com a finalidade de atender aos mais diversos e exigentes paladares. Esse trabalho de combinações requer bastante atenção, pois em cada região existe uma preferência acentuada e a empresa pretende atender a uma gama maior de consumidores, a exemplo do que acontece com os tipos de whisky.

A inovação do mercado é outra preocupação constante do empresário, que diz não ter entrado no mercado da cachaça para ser mais um e sim para inovar. Ele conta que começou o negócio tomando todas as precauções, com a finalidade de apresentar um produto de qualidade, comparando a Rio do Engenho com as cachaças já tradicionais. E assim tem feito durante esses anos e os frutos desse trabalho já começam a ser vistos nas feiras e exposições que tem participado.

Além de inovar para ganhar os já apreciadores de cachaça, o empresário pretende ingressar num novo mercado, formado pelo segmento jovem. Para tanto, criou a Acqua Benta, marca com nome original e de forte apelo de marketing para chamar a atenção desse novo público-alvo, além dos aromas do bálsamo e canela, que dá um buquê bastante diferenciado.

Atualmente, a Rio do Engenho produz cinco variedades de cachaça. A prata, mais rústica, semienvelhecida, descansada em alambiques de aço inox por seis meses e um forte sabor de cana; a Rio de Engenho Black; a Ouro e a Acqua Benta, envelhecidas por dois anos; e a Reserva, tipo especial, envelhecida por três anos. Cada uma destinada um tipo de paladar dos apreciadores da boa cachaça.

Padrão de qualidade

A fabricação de uma cachaça de qualidade passa pela padronização da matéria-prima – a cana – e de todas as fases de produção. E esse cuidado começa com a plantação da cana na época certa, e o corte quando o índice de açúcar estiver ideal, nem mais nem menos, tudo conferido no espectrômetro. Toda a cana cortada deve ser moída no mesmo dia, no sentido de que a sacarose não comece a se transformar em outros açucares.

Outro cuidado especial para a produção de uma excelente cachaça é a fermentação, para que sejam conseguidos 15 graus de açúcar. Todo o processo de fermentação é totalmente natural, sem a adição de milho, pão ou outros produtos. O único componente utilizado é um fermento liofilizado desenvolvido pela Universidade Federal de Lavras, em Minas Gerais, a partir da própria cana, sem qualquer aditivo químico.

Também deve ser observada a limpeza dos equipamentos, livre de resíduos, bem como o controle do fogo. Num alambique na proporção do implantado na Rio do Engenho, a calda deve destilar de um litro a um litro e meio a cada minuto. Para manter o calor constante, é utilizada uma caldeira, cuja pressão é observada a todo o instante no manômetro, evitando as variações de temperatura.

Cachaça destilada, o armazenamento é outro cuidado a ser tomado para evitar interferência externa na qualidade. Por isso, é interessante que as dornas – de aço inoxidável e de madeira – estejam em local úmido. Cada fase, no entender do empresário, deve ser vista com o próprio olho do dono, inclusive durante o engarrafamento, utilizando garrafas novas, límpidas. Antes, porém deve ser observada se a graduação está nos 38 graus pretendidos.

Barris fabricados com madeiras nobres


Assentada na história

A Fazenda Chapada dos Boiadeiros está localizada numa região rica em história e onde foram implantadas as primeiras plantações de cana-de-açúcar do sul da Bahia, ainda nos tempos das Capitanias Hereditárias. Segundo contam os historiadores ilheenses, em 1537, o terceiro governador-geral do Brasil, Mem de Sá implantou o Engenho de Santana, de relevante importância histórica.

Porém uma série de crises com rebeliões de índios e de escravos resultaram em decadência econômica e diversas trocas de proprietários do território com o passar dos séculos. Por volta de 1573, Santana tinha 130 escravos, mas, por ser um tanto distante e isolada, sofreu ataques indígenas entre 1590 e 1601. Por volta de 1618, a ordem dos jesuítas havia adquirido Santana por herança.

Hoje, na localidade de Rio do Engenho, às margens do Rio Santana, ainda podem ser vistas as ruínas do engenho e abriga a terceira mais antiga igreja do Brasil, a Capela em homenagem a Nossa Senhora de Santana. A cada dia o distrito ilheense recebe novos investimentos privados na área de turismo, o que privilegia a difusão da cachaça Rio de Engenho em todo o país.

*Radialista, jornalista e advogado


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