TARZAN ACABA COM A CARREIRA DO GALINHO


Tarzan vence a luta por nocaute

Por Walmir Rosário

De início, um aviso aos navegantes: Dessa história, eu somente conhecia uma pequena parte, que assisti e presenciei com atenção. O restante me foi passado pelo memorialista Raimundo Antônio Tedesco, que conhece, de cor e salteado, fatos pretéritos e atuais tidos e acontecidos tanto em Buerarema (desde que ainda atendia pelo nome Macuco) como em Canavieiras, já devidamente corrigidos e melhorados.

Estando eu em Eunápolis lá pelo começo década de 1970, num dia desses de folga, fui convidado por um amigo a assistir a uma contenda que prometia ser a do século, pelo alto grau e patente dos lutadores. De um lado, Tarzan, o sanguinário dos ringues, um itabunense que também atendia como Dal Broa, consagrado goleiro do Botafogo do bairro Conceição, que abandonou o gol e assumiu a luta livre.

Do outro lado do córner, um atleta, se é que poderia assim ser chamado, baixinho, magrinho, porém esbelto e com músculos aparentes, apresentado como uma das revelações para a renovação do boxe sul baiano. Embora amador, e sem um histórico de lutas (cartel) que metesse medo nos adversários, diziam que fora formado nas academias de boxe de Canavieiras, e que prometia galgar a carreira rivalizando com o galinho Éder Jofre.

À época, Eunápolis não se parecia nada com a metrópole de hoje, embora já fosse um próspero centro comercial e de serviços, sem contar com o grande número de indústrias madeireiras. Corria muito dinheiro, mas era pobre na área de diversões, o que fazia com que uma contenda de luta livre se tornasse, realmente, o evento do século para diante do escasso calendário de diversões.

Era só o que se falava em toda a cidade, com discussões e apostas, sempre com uma margem favorável a Tarzan, o sanguinário dos ringues, que reinava sozinho no próspero povoado, o maior do mundo, como se orgulhavam. Tarzan, todos conheciam, e seus feitos já ultrapassavam “as fronteiras”, principalmente após derrotar, nos primeiros rounds, dois lutadores de Itamaraju, vencedores nos estados do Espírito Santo e Minas Gerais.

Do outro lado, os que torciam contra Tarzan queriam vê-lo derrotado, justamente por um atleta iniciante, boxista, peso-leve, como o ídolo Éder Jofre, que poderia se mover de forma incessante no ringue, até cansar o adversário. Nas constantes discussões, o lutador canavieirense era ressaltado pela sua jovialidade, e que desbancaria um lutador gordo, fora de forma e ultrapassado. Seria questão de minutos, diziam.

Parecia até coisa do destino, quando na sexta-feira chegou a Eunápolis um funcionário do Banco do Brasil, Raimundo Tedesco, que ao tomar conhecimento da luta, exaltou os feitos do lutador canavieirense, aumentando o interesse e o ranking de aposta. E a luta passou a ser destacada como a “guerra” entre Davi e Golias, na qual o pequeno venceria o gigante, exatamente como estava escrito na Bíblia.

E esse zeloso funcionário do Banco do Brasil contou passagens da vida pregressa do galinho canavieirense, mostrando sua evolução física, desde que deixou o distante povoado do Pela Jegue, onde morava até chegar ao Três Xis, bairro da cidade de Canavieiras. Já àquela época, disse que ele não levava desaforo para casa, e era um “Ás” nas brigas e lutas, perdendo apenas uma, por nocaute, para o Crente da Pipoca, mas que não seria uma mancha em seu currículo, o que aumentou seu cacife na banca de apostas.

À noite de sábado, num movimentado bar, próximo às casas de diversões noturnas, chegaram a levantar suspeitas da luta, que seria uma armação, com a finalidade de ganhar dinheiro. O que perdesse pediria revanche, e uma nova luta seria realizada no próximo domingo, com a renda dividida entre eles, inflamando ainda mais o debate, e por pouco não chegariam às vias de fato, não fosse a turma do deixa disso.

Domingo à tarde, ambiente lotado, como nunca foi visto, cerveja, whisky e outras bebidas rolando pelo salão, eis que chegam os lutadores, cada um com sua torcida, levando a plateia ao delírio. Roupa trocada, sobem ao ringue, o árbitro passa o regulamento e eles partem para o primeiro round, com fortes investidas do galinho boxeador para cima de Tarzan, o sanguinário dos ringues.

Soa o gongo, cada um para o seu córner, tomam água, molham a cabeça e voltam ao centro do tablado. De novo, o galinho canavieirense investe em Tarzan, que experiente, começa a se esquivar e rodar pelo ringue. Volta e meia, quando vê a guarda aberta, aplica uns diretos no fígado. No terceiro round, o galinho boxeador já não volta com tanto ímpeto e recebe mais uma meia dúzia de ganchos no fígado até perder a mobilidade.

Experiente, Tarzan abre a guarda, oferecendo a cara para o galinho boxeador, que cai no lero do esperto lutador, que inicia uma série de golpes até derrubar o adversário, que cai e não consegue mais se levantar. A plateia foi ao delírio e chamaram um médico para atender o atleta, que sequer conseguia respirar. Medicado, foi aconselhado a ir ao hospital tomar umas injeções e se recolher ao descanso do lar por semanas. E assim foi feito.

Foi uma carreira curta, de sucesso, que mesmo efêmero, por conseguir provocar e dividir a população de Eunápolis em torno da chamada luta do século, o que não aconteceu dentro das expectativas. Com o numerário ganho nas lutas (principalmente essa) em Eunápolis, Tarzan voltou a ser o Dal Broa, abandonando as lutas e se tornando comerciante do ramo de bebidas e comidas de sustança em Itabuna, no conceituado Mocotó do Tarzan.

Já o nosso galinho boxeador, após ouvir os amigos, resolveu seguir os conselhos e se dedicar às atividades profissionais de músico crooner em alguns conjuntos, escritórios, dirigindo grandes empresas nas áreas pública e privada, até a sonhada aposentadoria. Hoje, Valdemar Broxinha leva uma vida bucólica em seu sítio, devotada à família e aos amigos, e o sonho de se tornar o novo Éder Jofre já faz parte de um passado muito distante. Foi apenas um sonho que acabou não se tornando realidade.




Comentários

  1. Olá leitores, na minha infanci3no Bairro da Conceição ficava vislumbrado com Dal Broa pu Dao Tarzan todo de preto circulando no jardim em frentre a Igreja e fazendo gingas para alegrar a gurizada. Uns fucavam com medo dis golpes, rsrsrsr, mas era um barato ouvir as histórias por ele contada. Um camarada do bem!

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