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O cacau, da amêndoa ao chocolate - Foto Águido Ferreira - Ceplac |
Por Walmir
Rosário*
Por muitos e longos anos o cacau produzido na Amazônia era
visto como de qualidade inferior. E realmente foi. Mas essa realidade faz parte
do passado e a cada dia a lavoura cacaueira amazonense nos surpreende,
principalmente nos estados do Pará e Rondônia. E o chocolate produzido lá pelas
bandas do norte brasileiro vem ganhando prêmios e mais prêmios nos eventos
internacionais.
E essa mudança não surpreende os que veem a cacauicultura
brasileira com um olho no padre e outro na missa, como se diz. É verdade que
ainda existe aquele cacau nativo e de qualidade inferior, cercado de vassoura
de bruxa por todos os lados, mas estamos falando das novas plantações,
incentivadas pela Ceplac e tão combatida pelos cacauicultores do Sul da Bahia.
Pra começo de conversa, o pé de cacau plantado na ponta do
facão hoje só pode ser visto nos livros do conterrâneo Jorge Amado e essa nova cultura
é cercada de conhecimento científico. A genética foi revirada pelo avesso, a
clonagem é o assunto do momento, a produtividade é a marca a ser batida. Porém,
a qualidade do produto final, o chocolate, é a galinha dos ovos de ouro dos
bons produtores.
Quem é do negócio chocolate não se surpreendeu quando a
revista Forbes estampou que Rondônia produz o melhor e mais espetacular cacau
especial do Brasil. E o anúncio foi feito justamente em Ilhéus, por ocasião do
Concurso Nacional de Cacau Especial do Brasil – Sustentabilidade e Qualidade,
nesta sexta-feira (24). Na terra do maior concorrente.
Um dos prêmios foi concedido ao produtor Robson Tomaz de
Castro Calandrelli, do sítio Três Irmãos, no município de Nova União, em
Rondônia, vencedor na categoria mistura. Já na categoria varietal (única variedade
genética de cacau), o vencedor foi Deoclides Pires da Silva, da Chácara Tiengo,
em Jaru, em Rondônia, cuja lavoura foi implantada pelos seus pais em 1970.
Outros produtores de Rondônia e do Pará também foram
premiados. Da Bahia, especificamente, Ilhéus, subiu ao pódio, como disse a Forbes,
a produtora Marina Paraíso. Ao que parece, na cacauicultura, o sol já nasce para
todos, desde que o produtor busque o seu lugar com os conhecimentos científicos
disponíveis e os que ainda estão por vir.
Não encaro esse concurso como uma derrota dos cacauicultores
baianos, mas como um alerta de que não basta cair, anualmente, cerca de mil e
quinhentos milímetros de chuvas bem distribuídas; a sombra da Mata Atlântica; os
solos excepcionais do Sul da Bahia; a melhor fermentação e os notáveis
barcaceiros. Há anos o cacau está sendo produzido a pleno sol, com irrigação e
o conhecimento dos produtores do cerrado, tudo isso sem os inimigos naturais.
Além da pretendida alta produtividade, como chegar a mil
arrobas por hectare, é preciso que o cacauicultor tenha em vista produzir cacau
de qualidade, como muitos vêm fazendo com “os cacaus finos” no Sul da Bahia.
Para o cacauicultor, a premiação não é um afago ao ego, mas o consequente sobrepreço
no seu produto, em amêndoas ou em chocolate pronto. Mais dinheiro no bolso.
Por se tratar a cacauicultura iniciativa privada, sem gozar
das antigos benesses dos subsídios governamentais, poderemos assistir a uma
disputa mais acirrada no próximo ano. E garanto que será páreo cada vez mais
duríssimo com a entrada do cacau do cerrado. Essa competição nos mostra, ainda,
a especialização dos produtores de cacau in natura (amêndoas) e em
produto final, o chocolate.
Não poderia deixar de dar um testemunho sobre a melhoria
da qualidade da cacauicultura da Amazônia, desde os anos 1990, quando
assistimos aos mais diversos experimentos. E eles sempre visavam um produto de
qualidade e mais dinheiro na sua conta bancária, a exemplo do sombreamento de cacaueiros
com mogno e outras espécies de madeira de lei. Um consórcio que unia o útil ao
agradável.
E registramos esse incremento da cacauicultura nos estados
de Rondônia e no Pará, especialmente às margens da rodovia Transamazônica,
locais que estão recebendo os “louros” pelo excelente tipo de investimento e
administração. E mais, os cacauicultores da Amazônia, de cerca de 40 anos pra
cá, somente foram conhecer o cacau assim que chegaram do sul do país à Amazônia.
Lembro-me, que nesta época, os bancos do Sul da Bahia
queriam distância dos produtores de cacau, enquanto os da Amazônia visitavam os
cacauicultores com tentadoras propostas de financiamento à lavoura. As agências
bancárias disputavam as exposições da Ceplac como forma de atrair os
agricultores, o que chamou a nossa atenção (eu, que editava a revista “Ceplac,
um bom caminho”, o jornalista Odilon Pinto, e o fotógrafo Águido Ferreira).
O certo é que os tempos mudaram e a cacauicultura não sobrevive
mais do choro por preços melhores nos mercados interno e internacional, tampouco
de financiamentos subsidiados e dívidas perdoadas. A realidade atual é oferecer
ao exigente mercado cacau em amêndoas e/ou chocolate, de qualidade superior.
Quem oferece o melhor produto recebe, em troca, preços especiais.
São as leis do mercado.
*Radialista, jornalista e advogado
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